A região do Largo da Ordem é o coração do setor histórico de Curitiba desde 1971. É o local onde muitos moradores da cidade se encontram e revivem suas lembranças. São casas, prédios, igrejas, que juntos formam uma coleção responsável por manter a memória da cidade no imaginário coletivo. Essas memórias são acessadas com a seleção e a incorporação das lembranças mais importantes para cada um.
O Largo da Ordem, assim como outros centros históricos de diferentes cidades, é um centro de preservação da memória. Uma biblioteca da história de Curitiba e um centro de divulgação de conhecimento. Não por acaso é lá que está Fundação Cultural de Curitiba, parte do acervo do Museu Paranaense, galerias e escolas de arte e antiquários. Como parte desse acervo histórico está disponível a visitação gratuita, é um símbolo de conhecimento democrático e acessível a todos.
Pra mim esse pedaço da cidade sempre teve um valor especial, muitas experiências estão associadas a ele. Os lugares freqüentados na adolescência, a feirinha onde levei amigos vindos de fora, os bares de hoje. Enfim, é um elemento significativo do meu acervo pessoal.
No passeio com os colegas revi a casa que abrigou a primeira festa que fui, aos quinze anos, o bar onde mais tarde fui com meu primeiro namorado, e outro que costumava freqüentar com colegas de faculdade. Todos hoje fechados. São lugares da memória, cheios de signos.
A comunicação e o conhecimento estão em cada tijolo, tinta, pedras e na arquitetura antiga das casas, que nos remetem ao passado. Pois mesmo sem termos vivido na época do auge daquela região nossos conhecimentos anteriores, a enciclopédia segundo Eco, nos permite associações diversas. Outras pessoas presentes ao passeio tinham memórias parecidas, o que mostra que possuímos um acervo coletivo com relação a um ponto antigo da cidade, que faz parte da história de todos. No entanto, alguns dos presentes não eram de Curitiba, o que deu ao velho Largo uma outra cara. Passear pelas ruas do centro da cidade tendo ao lado uma pessoa que a via pela primeira vez, ou que morava na cidade há pouco tempo, foi algo muito interessante.
Cada um tinha seu próprio universo de expectativas, e eram diferentes dentre os que tinham ou não familiaridade com a paisagem.
Explicar a cidade vista através dos meus olhos, baseado em meus acervos pessoais, à outra pessoa, me fez ver coisas que eu nunca tinha percebido como o uso repetido de cores como o amarelo e o vermelho, detalhes de algumas construções, o marco zero da cidade e o busto do Barão do Rio Branco na Praça Generoso Marques.
A esse visitante não-curitibano, o acervo, a impressão que tinham da cidade, era a daquela Curitiba cidade de primeiro mundo, limpa, sem lixo nas ruas. Mas ao verem no centro da cidade mendigos, crianças de ruas e lixo, ficaram espantados. O lado da cidade que não aparece nas publicidades institucionais não fazia parte de seu imaginário, era algo novo. Contrariando seus universos de expectativa.
Nesse passeio, através das conversas e das observações entre colegas, pudemos reviver o passado, através da seleção que cada um fez de suas próprias memórias. Tivemos a oportunidade de compará-las no exercício final, já em sala de aula quando conversamos sobre as impressões que tivemos do passeio para podermos montar uma maquete. Foi possível observar os pontos comuns à observação de todos, aqueles que fazem parte da memória e da seleção coletivas e os particulares, visto sobre a ótica de cada um.
Mesmo sem perceber fazemos uso de nossos acervos a todo o momento. Cada passeio, leitura, filme que vemos, traz de volta a memória dos anteriores. Quando visitamos uma cidade ou revemos nossas próprias, usamos tudo o que sabemos sobre aquele espaço. Nossa memória é nossa biblioteca, a qual recorremos sempre que queremos resgatar, consultar nosso acervo particular. E também o estamos sempre atualizando, com novas idéias, impressões, como livros novos colocados nas estantes.